Comentário

Açores não tão isolados: santos dos últimos dias em ilhas remotas ligados ao continente e ao novo templo

ANGRA DO HEROÍSMO, AÇORES — Paulo Alves lembra-se do momento de há alguns anos, sentado numa praia da Ilha Terceira dos Açores, observando a sua esposa, Tânia, e o filho mais novo, Samuel, enrolarem as calças e correrem em direção ao mar. A cena está indelevelmente gravada na sua memória – céu azul, Oceano Atlântico azul e os sons de risos e das ondas a rebentar na costa.

“Eu olhei para o céu e disse, ‘Obrigado, Deus, sei que o selamento do templo é verdadeiro e que posso ter esta família para a eternidade no reino celestial’”, disse Alves, que agora é o presidente do Distrito Açores Portugal.

Não importa que os Açores fiquem a quase 1.600 quilômetros de distância do continente europeu.

Não importa que os membros de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias sejam poucos nas ilhas remotas. “Podemos viver longe do templo ou de qualquer outro lugar na terra, mas os selamentos permanecem ativos em nossa vida”, disse ele.

O presidente Alves quer que os santos dos últimos dias açorianos não só sejam parte de uma Igreja global, mas também aprendam com ela. “Quando estamos isolados do mundo, temos a nossa própria cultura. Mas eu acredito na cultura dos santos dos últimos dias. (…) Quero que os membros sigam o caminho mais alto – o padrão mais alto.”

Os Açores e a Igreja

Os Açores – é um arquipélago de nove ilhas no meio do Oceano Atlântico Norte, a mais de 1.500 quilômetros a oeste de Portugal e uma das duas regiões autônomas do país. As ilhas são massas vulcânicas formadas na junção das placas tectónicas da América do Norte, Eurásia e África; e se elas forem medidas desde os picos da ilha até às suas bases no fundo do oceano, as “montanhas” dos Açores estariam entre as mais altas da Terra.

Embora as ilhas tenham sido identificadas já no século XIV, os colonos portugueses só chegaram no século seguinte. Os Açores serviram primeiro como locais-chave primeiro para os exploradores que navegavam de Portugal e de outras nações europeias e, mais tarde, para as expedições baleeiras de 1700 a 1900.

A erosão natural das ilhas, combinada com o clima ameno, resultou em encostas verdes e terrenos agrícolas férteis que contrastam com praias negras e litorais rochosos. As atividades predominantes são a agricultura, os lacticínios e a pesca, com o turismo a crescer rapidamente.

                                        

Cerca de metade do quarto de milhão de habitantes dos Açores situa-se na Ilha de São Miguel e outro quarto na Ilha Terceira, onde se encontram as bases militares que, desde a Segunda Guerra Mundial, têm sido partilhadas ou arrendadas por outros países.

Embora não tenha sido oficialmente reconhecida em Portugal até 1974, A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias estava representada 20 anos antes nos Açores por membros militares designados para servir na Base Aérea das Lajes na Terceira.

Um grupo de militares estabelecido em 1958 precedeu o Ramo Lajes, organizado em 1967. Maria Morgado, batizada por membros do ramo naquele ano, é considerada a primeira açoriana conhecida a ser batizada em solo português.

Em 1979, a Missão Portugal Lisboa designou os primeiros missionários para as ilhas. O primeiro ramo português foi organizado em Angra do Heroísmo, em 5 de março de 1980, com a criação do Distrito Terceira Portugal – atual Distrito Açores Portugal – em 1982.

Um legado de membros

Naquele ano, Ricardo Resendez, de 18 anos, foi batizado em Ponta Delgada em 24 de julho – Dia dos Pioneiros. Ele havia-se interessado pela religião, mas era tímido; tanto um vizinho quanto seus pais cuidaram dos preparativos para que os missionários o visitassem.

Com o desejo de compartilhar o evangelho bem antes da conversão, ele cumpriu as suas obrigações militares antes de servir uma missão aos 22 anos. Os pais dele não aprovavam e queriam que ele continuasse a trabalhar, mas Resendez saiu de casa com uma passagem de avião para sua área designada em Portugal e com poucos pertences – as calças que usava, um par de camisas brancas e gravatas que lhe foram dadas pelos élderes de São Miguel, um par de sapatos e uma bolsa desportiva pequena.

Surpreso ao ver o pouco que Resendez possuía, o presidente da missão pediu a outros missionários que ajudassem o seu guarda-roupa. Quando terminou a sua missão de dois anos, Resendez – atualmente presidente do Ramo da Ribeira Grande em São Miguel – recebeu um telefonema dos seus pais a dar-lhe as boas-vindas pela volta a casa.

Alexandra Camacho Rodrigues, atual esposa do conselheiro da presidência do distrito, João Joaquim Pinto, é atualmente o membro mais antiga dos Açores, batizada aos 18 anos de idade em 14 de junho de 1980, no Oceano Atlântico. Com a praia já lotada onde o seu batismo seria realizado, a ordenança da Alexandra foi transferida para um lugar menor e mais isolado, onde o mar entreva pelas rochas irregulares.

                                             

Nair Alves já havia notado os missionários da Igreja antes e pensava que o nome “Mórmon” que tinha ouvido representava algum tipo de deus. Um gesto gentil de um élder nos correios de Angra fez com que ela olhasse mais atentamente a plaqueta com o nome de um missionário e visse a inscrição “A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias”.

“Fiquei espantada porque dizia ‘Jesus Cristo’”, lembrou-se ela. “Esse era o nome do meu Deus, não de outro deus – e eu fiquei feliz.”

Ela e o marido, Luís Alves, e o filho mais velho, Herberto, foram batizados em 1985. O seu segundo filho, Paulo Alves, tinha apenas 7 anos e foi batizado mais tarde.

                                           

Enquanto as fortes tradições católicas das ilhas tornavam a conversão desafiadora, fortes laços familiares têm ajudado alguns a serem recetivos ao aprendizado da fé dos santos dos últimos dias.

Nair Alves tinha perdido o pai, que teve um cancro, e faleceu aos 66 anos. “Eu tinha um grande desejo de saber sobre o meu pai, de saber o que era um espírito, e principalmente queria saber se ele não estava a sofrer”, disse ela, acrescentando que orou pedindo entendimento.

Ao encontrar os missionários nos correios, as primeiras perguntas que ela fez foram se eles acreditavam na ressurreição e se podiam falar-lhe sobre um mundo espiritual. As respostas que eles deram prepararam o caminho para as lições na casa da família Alves.

Da mesma forma, conhecer o plano de salvação abençoou o recém-converso Júlio Costa, que recebeu um Livro de Mórmon na sua primeira visita de domingo à capela de Ponta Delgada. “Não havia dúvida de que eu estava voltando, porque senti algo bom”, disse Costa, que foi batizado em abril.

Pensando na avó que tinha ajudado a criá-lo e que faleceu sete anos antes, Costa está animado para ir ao Templo Lisboa Portugal no próximo mês para ajudar os seus antepassados por meio das ordenanças. “Saber que as famílias podem ficar juntas para sempre foi revelador”, disse ele. “A razão é unir a minha família — levar os seus nomes ao templo e uni-los do outro lado do véu.”

E Cátia Almeida, de 22 anos, lembra-se de como abraçar o evangelho restaurado quando ainda era uma jovem adolescente a ajudou a amenizar a ausência de uma avó que havia falecido. “Eu sentia-me realmente sozinha”, disse Almeida. “Mas encontrei pessoas que se preocupavam comigo. Senti o Espírito, e senti-me parte de tudo na Igreja.”

Conexões com o continente

Apesar da distância para Portugal e para o continente europeu, os membros da Igreja nos Açores têm boas conexões de longa distância.

João Joaquim Pinto e Alexandra Camacho Rodrigues serviam como missionários em Portugal quando se conheceram. Quando concluiu a sua missão, Pinto — que foi batizado na sua terra Natal, a Ilha da Madeira, outra ilha autônoma de Portugal — recebeu não só permissão, mas incentivo para escrever para a Sister Camacho enquanto ela ainda servia. Os seus pais recusaram-se a recebê-lo na Madeira, e ele foi para os Açores para trabalhar, escrever e esperar.

Eles casaram-se em 1986 e foram selados em 1989, e os dois e a mãe dela — que havia-se filiado à Igreja depois da sua filha — foram de avião para Lisboa e, em seguida, viajaram de autocarro três dias até chegarem ao Templo de Frankfurt Alemanha e realizar as investiduras, o selamento e as outras ordenanças lá.

                                         

Paulo Alves e a sua esposa, Tânia, que entrou para a Igreja em Portugal aos 20 anos de idade, conheceram-se no Templo de Madrid Espanha enquanto cada um deles estava a participar nas caravanas ao templo com outros adultos solteiros – ele na caravana dos Açores e ela na de Portugal. Casados e selados em 2008, passaram quatro anos em Portugal, tempo suficiente para Paulo Alves observar como as alas e estacas funcionavam lá, alimentando a esperança de que uma futura estaca fosse criada nos Açores.

Em 2012, o Alves mudou-se de volta para a Terceira, onde trabalha como enfermeiro pré e pós-operatório e onde serviu como presidente do distrito por 20 meses. “Creio que é a vontade do Senhor que estejamos aqui para ajudar”, disse o presidente Alves.

E Almeida conheceu o seu noivo, João Barata, numa conferência especial para jovens, há oito anos, em Portugal, de onde ele é. Uma amizade de sete anos levou a um namoro de um ano, depois a missão de Barata em Angola e a missão de curto prazo de Almeida nos Açores.

                                       

Mas o aprendizado e o progresso espirituais não dependem do continente. “Acho que há muitos membros aqui com muita fé — eles têm que ter fé aqui — e a vida deles mudou com o evangelho”, disse Tânia Alves.

Rogéria Medina, batizada há três anos com seu marido, disse que ela aprecia o aprendizado espiritual. “Não sabíamos nada de religião antes de conhecermos os élderes; não dávamos muita importância à religião”, disse ela. “Aprendi coisas que nunca aprendi na vida — as escrituras, como orar — e continuo a aprender.”

Um novo templo em Portugal

A distância entre os Açores e o novo Templo de Lisboa Portugal é semelhante à distância de Salt Lake City a Des Moines, Iowa ou Nova Iorque ou a Tallahassee, Flórida. No entanto, os santos dos últimos dias açorianos estão animados por terem um templo mais próximo, para o qual eles podem fazer uma viagem de avião sem escalas em vez de terem que apanhar voos com muitas escalas ou viajar muitas horas de autocarro para chegar aos templos de Madrid ou Paris.

                                  

No entanto, apesar da distância e das viagens longas aos templos, os santos açorianos frequentavam-nos e serviam neles.

O élder Andersen abençoa Portugal para ser uma terra de liberdade, prosperidade durante a oração dedicatória do templo de Lisboa

Como aconteceu com a família Pinto em 1989, quando Luís e Nair Alves levaram os seus três filhos — Herberto, Paulo e Nisa — e a mãe dela para as suas primeiras ordenanças do templo, eles tiveram de ir para Frankfurt porque o Templo de Berna Suíça estava fechado. A viagem ficou mais difícil quando a mãe de Nair Alves sofreu um derrame e precisou ser hospitalizada na Alemanha por duas semanas. Os membros da família Alves permaneceram fiéis e não apenas frequentaram regularmente, mas serviram no Templo de Madrid desde 2003. O seu serviço anual, por vezes, durou até três semanas, sem mencionar a missão de serviço da Igreja de 18 meses que fizeram naquele templo. Eles recentemente mudaram-se para iniciar um serviço semelhante como primeiro casal missionário do templo de Lisboa.

             O presidente Arnaldo Medina do Ramo Ponta Delgada disse que ter um templo em Lisboa “deve aumentar a fé dos membros, e eles se sentirão melhor, pois o templo agora está mais perto. (…) E quando alguns membros voltam às suas antigas tradições, precisam trabalhar mais para se manterem no caminho do convênio”.

Rogéria Medina, a sua esposa e presidente da Sociedade de Socorro do ramo acrescentou: “No templo, aprendemos a ter um enorme respeito pelas ordenanças. O respeito que temos pelos convênios nos fortalece para guardarmos os mandamentos e sermos obedientes.”

Isolamento desafiador

O isolamento do resto do mundo é apenas um dos desafios nos Açores. “Ser membro da Igreja em uma ilha é muito diferente de ser membro da Igreja em outro lugar”, disse Tânia Alves. “Por isso, poder ir ao templo com mais frequência nos ajudará a viver o evangelho mais plenamente.”

Os avanços tecnológicos — como a Internet e as comunicações globais — têm diminuído o isolamento, bem como auxiliado no progresso dos santos dos últimos dias.

O presidente Resendez menciona o trabalho da pesquisa da história da família como exemplo. “Posso estar em casa e fazer tudo. É muito fácil fazer este trabalho. Podemos aceder a tudo, e conseguimos ver a diferença.”

Enquanto isso, o presidente Pinto continua a trabalhar com os líderes municipais locais na obtenção de acesso a registos civis para processamento digital. O seu último esforço resultou nos registos de casamento de São Miguel dos anos 1800 e 1900.

Ao aprender sobre a Igreja, Costa encontrou a aplicação Biblioteca do Evangelho — incluindo as escrituras e o “Pregar Meu Evangelho”. Com seu aprendizado online, ele diz que quase poderia ensinar a si mesmo as lições missionárias — com a ajuda das Sísteres de tempo integral, é claro.

Ainda assim, os jovens açorianos têm oportunidades educacionais e de emprego limitadas que, por sua vez, limitam as oportunidades financeiras. É por isso que Almeida e Barata — que se casarão numa cerimônia civil este mês na capela de Ponta Delgada e depois serão selados no Templo de Lisboa — morarão em Portugal após o casamento.
“É difícil sair”, disse Almeida, “mas ao mesmo tempo, sinto como se tivesse feito tudo aqui e mudei.”

                            

Outro desafio é equilibrar as responsabilidades na Igreja entre os poucos membros. Os santos dos últimos dias açorianos de longa data a fizeram um pouco de tudo. O presidente Alves presidiu dois ramos antes de se tornar presidente de distrito; o seu pai, Luís Alves, e Resendez, ambos presidiram os ramos e o distrito em diferentes épocas.

“Os únicos chamados que não tive são o de presidente da Sociedade de Socorro e o presidente das Moças”, gracejou Luís Alves.

Os membros novos podem receber vários chamados na Igreja, como é o caso do presidente Medina, converso há três anos. “Dia a dia estou aprendendo algo novo”, disse ele.

Os líderes locais estão a trabalhar para manter um bom registo dos membros, contabilizando aqueles que faleceram, que saíram das ilhas, mudaram-se para outro lugar ou desapareceram. O distrito recentemente totalizou mais de 1.600 registos, comparado a uma frequência combinada de três ramos de 110 membros ativos.

O élder Robert V. Carter — que, com a sua esposa, a Sister Louise Carter, forma um casal missionário sênior juntamente com as quatro duplas de jovens missionários de tempo integral que servem nos Açores — tem trabalhado especificamente no ramo de São Miguel, onde os registros foram reduzidos de 700 para pouco mais de 200.

Depois do élder Carter ter servido como presidente de ramo e Sister Carter como presidente das Moças, eles tiveram a sua primeira missão nos Açores interrompida por causa do seu diagnóstico de cancro forçando um retorno antecipado a Pleasant Grove, Utah. Onze meses e um atestado de saúde mais tarde, eles voltaram e estão a meio caminho de um chamado de 18 meses, tendo passado 32 dos seus 34 meses na Missão Lisboa nas ilhas.

“Precisávamos voltar”, disse a Sister Carter. “Havia coisas que precisávamos fazer.”

O élder Carter adicionou: “Ainda há muito trabalho a fazer — esperamos que, no tempo que ainda nos resta, possamos deixar os ramos bem encaminhados.”

O futuro da Igreja nos Açores

Os líderes locais confiam na próxima geração para estabelecer ainda mais a Igreja nos Açores, com os jovens, os jovens adultos e os recém-conversos. Os líderes mencionaram os missionários açorianos que atualmente servem uma missão — um élder no Brasil e uma Sister em Londres — e os esforços com o primeiro programa de seminário diário depois do horário escolar, e com atividades dos jovens e adultos solteiros por todo o distrito, como por exemplo a recente excursão de observação de baleias que aconteceu no mês passado.

                       

“Quero olhar para os membros da Igreja aqui, como o Pai Celestial olha para nós, porque Ele trabalha com nosso potencial, e eu quero trabalhar neste potencial aqui”, disse o presidente Alves, acrescentando que “o desafio será ajudar os membros a entender a importância do templo em nossa vida. (…)

“A ‘Igreja’ para o Pai Celestial é cada pessoa — então podemos estar no Alasca ou nos Açores, e Ele sabe o nosso nome, Ele nos conhece, Ele nos ama. E sei que todos nós temos o próprio propósito na vida — faz parte de Seu plano onde nascemos, onde crescemos e onde vivemos. Ele conhece o Seu plano, e Ele sabe por que nascemos e onde nascemos.”

Tânia Alves acrescentou: “Ele nos ama onde quer que estejamos. Ele quer que cresçamos, que sejamos fortes e sejamos um exemplo aqui — todos os membros, não apenas nós. É uma grande bênção fazer parte disso. Porque onde quer que existam humanos, há filhos de Deus.”

A Igreja nos Açores tem agora um templo a apenas um voo de distância, uma presença missionária em curso, a mistura de membros maduros com membros jovens energéticos e o aumento da tecnologia trazendo o mundo exterior para mais perto das ilhas. “Consigo antecipar um grande futuro para a Igreja aqui nos Açores”, disse o presidente Alves, “porque estamos tentando permanecer no caminho do convênio, para trilhar o caminho mais elevado.”

Publicado em TheCurchNews.com
 

Observação do Guia de Estilo: Em notícias sobre A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, pedimos que use o nome completo da Igreja na primeira referência. Para mais informações quanto ao uso do nome, aceda ao Guia de Estilo.